domingo, 28 de junho de 2009

Bastidores


Bastidores. É uma ótima forma de se ver. Um ótimo lugar para se estar. Relacionar o planejamento com a obediência da execução. Observar a preparação, o exercício, o alongar dos músculos, das escápulas, das idéias. Nos bastidores, que para mim são como falésias, que do alto se antecipa a visão, sem perder a emoção por já estar antes de acontecer, vivo oportunidades, experimento prazeres secretos e depois exponho. Com consentimentos. Não sou um ladrão de cenas, mas empresto. Para formar a minha maneira uma obra de observação. Um estímulo de emoções quando se vê. Na fotografia me situo. Nela reconheço, me identifico ou identifico-a. Diferencio uma das outras e com tal precisão me confundo. Hora numa obra, hora nas coxias. Em meio aos andaimes, a beira dos cadafalsos. Nos bastidores destes espetáculos sinto as essências. Na platéia o jasmim, na laje o asfalto, no palco o linóleo, em meu corpo a amêndoa. Aliás, meu Criador, quem sou?

Inverno de dois mil e nove. Céu azul, ângulo baixo de luz, sombras esticadas.

Nos camarins, que agora são vestiários, os figurinos escolhidos são agora uniformes de boa segurança estreando em mais um grandioso espetáculo: a construção do novo SESC Belenzinho.

Como eu havia dito, as primeiras imagens foram feitas como do alto de uma falésia. No mirante da sede que fica ao lado da grande obra. E foi naquele exato instante que percebi o que estava por vir. Sorri.

Desci do cume e fui ao portão principal da obra onde me esperava o simpático Maurício, encarregado de me acompanhar durante a expedição. Sim, porque aquele lugar é enorme, cheio de perigos, obstáculos, o que me obrigou também a experimentar um figurino adequado para aquela cena. Na verdade, só fiquei com o capacete, que sem ele não se entra em nenhuma construção. Quanto a bota, por exemplo, que também é indispensável, tive que burlar as regras, pois não havia um par disponível com meu número. Na obra, de All Star, com atenção redobrada eu fui.

Senhoras e senhores, bom espetáculo!


As Escotilhas e os operários. - Primeiro ato.

Nesta obra são duzentos e quarenta atores em cena. Cada qual em seu papel, cada qual em seu ofício. Minha primeira visão deste grandioso ato foi através das escotilhas de um corredor escuro que nos levava ao interior do pátio.

Tripé montado, câmera no engate rápido, medição da luz externa, enquadramento, clic. Uma escotilha.

Lá vem um operário. Ele hesitou em passar na frente da câmera mas já era tarde, sua silhueta recortava a escotilha de uma forma brilhante e num exato instante ele ficou lá para sempre.

Se fiz duas, por que não três? Então, de escotilhas no quadro ponho todas de uma vez.

A obra está adiantada. Vamos atacar outro cume. Desta vez o da própria obra. No trajeto me surpreendo a cada passo. Não só nas fotografias, que são tantas, mas numa saraivada de massa de cimento vinda do terceiro andar de um andaime. Nada grave, o alvo foi em meu ombro com poucos respingos na câmera. O homem se desculpava insistentemente. Então eu disse a ele que não poderia querer estar naquela cena sem ser batizado. Ele riu. Eu segui.

Me impressiono com a luz destas estações frias do ano. O sol percorrendo à meia altura, recortando com graça os enquadramentos, iluminando na forma mais aplicada, produzindo contornos que incitam. E os objetos iluminados então? Piche, soldas, guindastes e andaimes.

Martelo, fumaça, pá e escotilhas. E se pá, mais escotilhas.

Óculos escuros por si só são bonitos. Estão sempre na moda. Luvas de raspa de couro e os cinturões de ferramentas. Os capacetes.

Os chapiscos e a massa fina na colher. Os tijolos, a tábua, a escada, a piscina. É tudo muito plástico. Mas não só plástico. Tem informações, tem política, tem experiências e demonstrações, tem interdependências, tem poesia, concreta ou erudita, tem a vida destes homens à prova. E tem muita arte sim...

...pois só artesãos como estes homens podem nos presentear com esta magnífica exposição de uma obra de construção.

Senhoras e senhores, uma salva de palmas para estes homens!


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